24 de ago. de 2012

O Feminino e a Expressividade nas Aulas de Dança Contemporânea


O Feminino e a Expressividade nas Aulas de Dança Contemporânea

As aulas de dança Contemporânea que ocorrem no bairro Ponta Grossa, localizado na Zona Sul da cidade de Porto Alegre – RS estão sendo marcadas por uma forte presença feminina, pois desde o princípio o grupo é formado por mulheres e em grande parte da terceira idade com ricas experiências de vida e desejos surpreendentes de autonomia, autoconhecimento e liberdade.

As atividades de ritmo e expressão corporal propostas nas aulas de dança trouxeram à tona o que estava por aflorar nas participantes e estava timidamente escondido em corpos que inicialmente pouco se movimentavam e silenciavam a voz. Os sequentes encontros semanais permitem a liberdade para a exposição de idéias através da expressão corporal e da voz que dão vida às histórias passadas e ao presente de cada participante apontando novas perspectivas para o futuro.

Este trabalho tem revelado aspectos importantes da arte para o crescimento pessoal e social. Os debates de rotina ao concluir as atividades provocam reflexões e desabafos emocionantes em torno de temas que naturalmente envolvem questões do feminismo, como: padrões de beleza corporal, trabalho, maternidade, lar, vida conjugal, religião, escolaridade.

Fica claro que houve e ainda há grande cobrança em relação a aspectos da beleza corporal na vida destas mulheres, desde as que possuem mais idade, como é o caso de algumas participantes que tem oitenta anos de idade, até as mais novas que possuem por volta dos cinquenta anos de idade. Para muitas a vaidade é algo que pesa nas suas vidas, pois reflete o que os outros querem enxergar e não o que realmente elas vêem sobre si.

 Uma participante de sessenta e dois anos contou emocionada que sofria de depressão porque as pessoas que a conhece de muito tempo no bairro perguntam se ela está bem toda a vez que ela sai de casa, pois seu corpo físico teve transformações que possui consciência que é devido ao passar dos anos. Disse que as pessoas não conseguem perceber isto e a fazem se sentir mal e que com as aulas de dança está encontrando formas de ficar feliz, de se aceitar e de viver a vida com intensidade.

Outro desabafo foi de uma participante que desde a infância teve o sonho de usar meia- calça arrastão e maquiagem, e sempre ser reprimida pelos familiares que a proibiam dizendo que estes usos eram de mulheres da prostituição. Relatou que agora, quando a arte passou a integrar sua vida, tendo autonomia, representou um personagem no teatro o qual usava a tal meia-calça, e como resultado perdeu o medo que tinha de utilizar o que ela tem vontade no seu cotidiano. Já em relação à maquiagem, ainda prefere utilizar somente batom, devido a um fato que ocorreu quando criança que a marcou demais: ela se maquiou e estava muito feliz para mostrar aos familiares, quando estes a viram disseram que estava horrível e a fizeram remover do seu rosto.

A grande maioria destas mulheres relatou ter cursado somente parte do ensino fundamental e agora, quando “etapas da vida” já foram concluídas, voltaram a estudar. É importante salientar que esta expressão, “etapas da vida”, foi utilizada no sentido de referir-se às obrigações que foram expostas no decorrer de suas vidas, como: trabalhar desde cedo no lar, casar, ter filhos e cuidar da casa. Hoje, fazem o que nunca fizeram e gostariam de ter feito quando jovens e por isto afirmam estar frequentando as aulas de dança, já que isto possibilita a aprendizagem de algo desconhecido e gostoso, sobretudo, para o autoconhecimento e a exposição de seus pensamentos e idéias, para assim se sentirem mais mulheres.

Este grupo é desafiador e envolvente. Jogam em questionamento as concepções conservadoras a respeito do universo feminino e da sociedade em que vivemos. Quanto à terceira idade esta é a expressão da sabedoria, é um escape para absorvermos novas perspectivas sobre o humano que teve seus desejos reprimidos manifestados no corpo e na voz. Ensinar estas pessoas possibilita aprender a viver a vida desde jovem em sua plenitude com identidade, igualdade e respeito.


Por Marilice Bastos – Oficineira de Dança Contemporânea

2 comentários:

carilevi disse...

mas tá bonito esse blog!! parabéns pelas fotos das oficinas e textos dos oficineiros! bjus carina

Poesia Inclusiva disse...

Que bela experiência... obrigada Marilice por compartilhar estes momentos e assim possibilitar crescermos junto com o teu grupo e contigo. Parabéns a estas mulheres que se buscam... lutam e dançam com a alma. beeijo, Roselaine Funari